Na segunda semana de junho deste ano, ocorreu o Seventh World Environmental Education Congress sediado em Marrakesh no Marrocos. Evento que reuniu pessoas de todo o mundo em uma pluralidade linguística, cultural e de abordagens da Educação Ambiental.
O Laboratório de Limnologia contou com a participação de três de seus integrantes, Reinaldo Bozelli, Erica Steagall e eu – Laísa Freire, todos com apresentações orais sobre projetos em andamento. As seções em que apresentamos os trabalhos foram: Promoting Environmental Education and Networking e Risks, health and environment. Além dos nossos trabalhos que discutiam a Educação Ambiental nas restingas brasileiras e a Educação Ambiental no contexto do licenciamento de petróleo e gás, estas seções contaram com trabalhos sobre formação de lideranças comunitárias, atividades de sensibilização, educação ambiental outdoor, educação ambiental para a formação docente em contextos de guerra, entre outros.
O congresso apresentou uma diversidade de perspectivas da Educação Ambiental, embora eu tenha notado uma ênfase na corrente do ecologismo “evangelho da ecoeficiência” [segundo a abordagem do professor e economista Martinez-Alier (2007)]. Esta corrente do pensamento ambiental pode ser caracterizada pela atenção e debate sobre os efeitos do crescimento econômico no âmbito da natureza, sendo pautada em questões de sustentabilidade, modernização ecológica e utilização “racional” dos recursos naturais (ALIER, 2007).
Ao longo do congresso, observei muitos trabalhos que relacionavam educação ambiental e água. Pude mapear 16 trabalhos apresentados em espanhol, 18 trabalhos apresentados em inglês e oito trabalhos apresentados em francês sobre esta temática. Como conteúdo, os trabalhos discutiam principalmente o uso sustentável da água e sua gestão e estavam dispersos nos diferentes nichos temáticos do congresso. Caso alguém queira conhecer os trabalhos apresentados, alguns estão online no endereço: http://www.weec2013.org/en/program/final-programme.html.
Além disso, o congresso foi um excelente momento de reencontro com pesquisadores e estudantes com os quais convivi algum tempo durante a minha estadia na Universitat Autònoma de Barcelona (UAB). Momento este de reafirmar parcerias, discutir o andamento de projetos como o “Água e escola”, “hortas urbanas e escolares” entre outras iniciativas do grupo GRESC@ – Grup de Recerca en Educació per la Sostenibilitat, Escola i COmunitat – coordenado pela professora Mariona Espinet do Departament de Didàctica de la Matemàtica i de les Ciències Experimentals da UAB. Foram muitas emoções e novas experiências.
Discutir Educação Ambiental em um país como o Marrocos foi muito curioso para mim. Isso porque a cidade em si, Marrakesh, me fez refletir sobre algumas questões que são escopo da Educação Ambiental como a questão da sociedade de consumo: quem está incluído nela e quem não? O uso da tecnologia e o discurso da economia verde: até que ponto se reflete sobre consequências nefastas da tecnologia? E também sobre sociedades sustentáveis: que quesitos deveriam ter? Seriam as mais modernas em termos de aparatos tecnológicos? Além é claro, de observar e vivenciar questões de gênero aparentemente exacerbadas naquela cultura. Estas reflexões surgiram não só a partir das discussões no congresso, mas também no processo de imersão em uma cultura diferente da minha.
Penso também que a escolha de um país onde o “hand made” é muito observado pode ser uma mensagem aos educadores ambientais e aos pesquisadores que participaram do congresso. Pergunto-me: até que ponto a sociedade em que vivemos, ou o espaço microssocial em que eu circulo, abandonou o valor das mãos, do trabalho manual, do cultivo, do contato com a terra e com os ambientes?… Sim, busquei esta expressão, pois me pareceu um modo interessante de caracterizar e entender o que vi, vivi, senti e ouvi… A relação que observei entre o ser humano e o meio, por meio da centralidade do uso das mãos no povo árabe e nos povos berberes me pareceu algo que gera maior conexão com ambiente, talvez por uma necessidade de sobrevivência, não sei, talvez por falta de escolha… Mas, por exemplo, refleti sobre a produção da cerâmica a partir de um trabalho minucioso de um artesão que dá “vida” à argila e que busca nas cores da natureza a inspiração e as essências para colorir suas peças… sobre o trabalho das artesãs divorciadas na extração do óleo de Argan com suas mãos grossas marcadas pela vida; observei os sucos artesanais tomados na praça Djemaa el Fna, o pão feito no forno de barro por mulheres donas de casa que, além disso, carregam o feno, cuidam das crianças, lavam roupa na beira do rio e se cobrem completamente em sinal de respeito a si, a Alá e ao semelhante, o comer de um trabalhador que só usa um pedaço de pão nas mãos…
Curioso foi observar que, em Madrid de regresso ao Brasil, pude perceber o quanto nossas mãos estão mediadas por maquinários. Ao tomar um suco de laranja, pude perceber que naquela cafeteria era tudo automatizado. Pude também observar em um saquinho de azeite de oliva um texto com uma observação de que o produto não havia sido manipulado com as mãos, que o seu processamento era todo mecânico. Então, olhei ao redor da cafeteria, ali, no coração de Madrid e observei quantas máquinas haviam… Instintivamente comparei com o “mundo das mãos” que acabava de deixar. Quis entender os discursos… indaguei a mim mesmo: quando nossas mãos são valorizadas? Em que situações o trabalho manual é valorizado? Por outro lado, pensei em produtos artesanais como as peças de cerâmica, roupas feitas/ bordadas à mão que são muito valorizados em nossa sociedade…Pensei no trabalho do cientista que muito tem de manual, principalmente o que vai a campo, coleta, faz experimento, faz intervenção, restaura ambientes…
Relaciono estas questões com o tema central do congresso que buscou a discussão e aproximação entre o urbano e o rural. E que materializou a mensagem do congresso em uma apresentação artística na abertura do WEEC 2013.
Por enquanto é isso, mas adianto que a experiência na região foi transformadora e me fez refletir sobre outras questões que futuramente vou escrever! Próximos passos… a água e o deserto, a interdisciplinaridade e o trabalho de campo.
Bibliografia Consultada: ALIER, J. M. O ecologismo dos pobres. São Paulo: Contexto, 2007.
Esplêndida texto Laísa. Cheio de vibração e reflexão. Partilho algumas destas tuas impressões, outras não vivi. Mas as que vivi também foram marcantes. Uma cultura tão diferente nos faz experimentar o não-estar, o não-ser, a certeza de não termos certeza, pois afinal, tudo pode ser tão diferente, mas igualmente tão natural como é a rotina de qualquer um. Parabéns por costurar tão bem coisas tão díspares, isto é enfrentar a complexidade, “aquilo que é tecido junto”, como explica Morin.
Obrigado Reinaldo! É por isso que a EA precisa muito da sua contribuição…