Há quase um ano atrás, o conceito de metacomunidades foi abordado aqui pelo prof. Reinaldo Bozelli, cujo tema foi um dos principais assuntos da tese de doutorado de uma de suas alunas. Como no mês que vem (fevereiro) ocorrerá a última coleta do “Projeto Metacomunidades”, vamos falar um pouquinho sobre este tema novamente…
O Projeto Metacomunidades ou, como oficialmente é conhecido, Conectividade Hidrológica e Biodiversidade em Ecossistemas Costeiros: Testando Paradigmas de Bactérias Planctônicas a Peixes, teve início em maio de 2010, com a finalidade de avaliar a importância da conectividade hidrológica na estruturação das comunidades de ecossistemas aquáticos costeiros do Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba. Para responder esta pergunta, o projeto teve uma abordagem comparativa entre organismos com diferentes níveis de organização e história de vida, que incluem bactérias, fitoplâncton, zooplâncton, insetos aquáticos, anfíbios, peixes e até macrófitas aquáticas.
Mas porque ecossistemas costeiros? E porque conectividade hidrológica? E onde entra o conceito de metacomunidade nesta história?
Contextualizando…
Metacomunidade é definida como o conjunto de comunidades locais que são conectadas pela dispersão de múltiplas espécies, que potencialmente interagem entre si (Wilson, 1992). Em ecossistemas aquáticos continentais, as metacomunidades são fortemente influenciadas pelos padrões de conectividade hidrológica que, na região Norte Fluminense, é promovida pelo extravasamento das lagoas em direção às áreas mais baixas do relevo, especialmente no verão, quando a precipitação é mais intensa. Desta forma, são formadas pequenas poças, permanentes e temporárias, funcionando como reservatórios da diversidade regional.
O tempo de permanência destas poças, assim como o tempo de conexão entre os corpos aquáticos, geralmente é regulado pela pluviosidade da região. Assim, mudanças nos padrões de precipitação podem determinar a presença ou não da conectividade entre os corpos d água. Além disso, sabe-se que ambientes aquáticos costeiros sofrem intensas variações de salinidade, em função de sua proximidade com o oceano. Por isso, um gradiente de salinidade pode se estabelecer nestes ambientes em função do regime sazonal de chuvas – o que afeta diretamente as comunidades.
Apesar deste conhecimento prévio sobre a região e os ambientes, pouco se sabe sobre a importância da conectividade hidrológica em corpos aquáticos costeiros (que pode promover a homogeneização dos fatores físico-químicos), e no quanto estes pequenos corpos d água, como poças, podem contribuir como fonte e/ou sumidouro de espécies para corpos aquáticos maiores, como as lagoas. Assim, o projeto foi criado, a fim de entender algumas destas questões…
Quais os ambientes estudados?
No projeto foram selecionadas 3 lagoas e 15 poças, totalizando 18 pontos de coleta. Cada lagoa apresenta um grupo de poças associadas, de modo que os ambientes foram divididos em sistemas: Sistema Garça (lagoa Garça + 6 poças); sistema Catingosa (lagoa Catingosa + 4 poças); e sistema Piripiri (lagoa Piripiri + 5 poças).
O que foi feito até o momento?
Desde maio de 2010, foram realizadas 12 campanhas trimestrais, abrangendo os períodos de seca e chuva. Além disso, coletas mensais das variáveis físico-químicas também foram feitas juntamente com observações in situ para se determinar o grau de conectividade entre a lagoa e as poças ao seu redor.
Até o momento, apenas os dados do primeiro ano de coleta (2010) foram analisados. Diferentemente do que esperávamos, o ano de 2010 se caracterizou pela quase ausência de conectividade entre os corpos aquáticos, em função de uma seca atípica no período chuvoso. Desta forma, foi observado que o filtro ambiental (especialmente salinidade) teve uma maior relevância na estruturação de praticamente todas as comunidades. Ou seja, na ausência de conectividade, o filtro ambiental é que explicou a grande heterogeneidade na composição de espécies entre os sistemas.
O mais interessante foi perceber que esta diferença entre as comunidades, dentro dos sistemas, está relacionada com o tamanho corporal dos organismos. Quanto menor o organismo, maior sua habilidade de dispersão. Desta forma, a ausência de conectividade comprometeu aquelas comunidades mais dependentes da presença de água para se locomoverem, como os peixes. Já para os organismos zooplanctônicos, que podem se dispersar através de formas dormentes ou até mesmo pelo vento, as comunidades se apresentaram mais similares dentre os corpos aquáticos de um mesmo sistema. Ou seja, ambientes com características parecidas (como o caso de muitas poças) tenderam a apresentar comunidades muito semelhantes, já que a dispersão não é um fator limitante para este grupo de organismos. Interessante, não?
Quem participa?
O projeto é coordenado pela professora Ana Petry, do Núcleo em Ecologia e Desenvolvimento Sócio-Ambiental de Macaé (NUPEM/UFRJ), da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Este projeto também conta com a parceria dos professores Tatiana Konno (também do NUPEM) e Reinaldo Bozelli, ambos da UFRJ, além de contribuir com a formação de diversos alunos, desde iniciação científica até o doutorado. Até o momento, dados deste projeto já resultaram em uma monografia, uma dissertação de mestrado, um artigo e, atualmente, faz parte da dissertação de mestrado do aluno Bruno Cortat (orientado pela prof Ana Petry), e da tese de doutorado da aluna Luciana Rabelo (orientada pelo prof Reinaldo Bozelli).
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