Por: Laísa Freire
“Água
É uma gota de chuva
É uma gota de nuvem
É uma gota de água pra viver
De gotinha em gotinha
Brilha no orvalho da manhã
De gotinha em gotinha […]”
(De gotinha em gotinha – Palavra Cantada)
Quem tem, ou convive com criança, certamente conhece esta canção… quem não conhece pode dar uma expiada na internet ou acessando De gotinha em gotinha. Foi com ela que convidamos o público em geral a conhecer mais sobre a água, durante a exposição Vida na água, água na vida que ocorreu semana passada (de 14 a 17 de outubro de 2014) no contexto da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Nesta postagem, relatarei algumas impressões de como foi vivenciar por mais um ano esta ação de divulgação científica que integra universidade e escola…
Viver uma exposição de divulgação científica
Na semana anterior à SNCT, eu participei do VI Congresso Internacional sobre Formação de Professores de Ciências e retornei ao Brasil com questionamentos e ideias ainda fervilhando em minha mente… Ao finalizar uma atividade – congresso – e “emendar” em outra – SNCT- , as coisas ficaram um pouco misturadas na mente, algumas continuidades e outras rupturas (o que penso ser desejável como parte do processo reflexivo e de aprendizagem), porém, o fato é que eu saia de um contexto científico de divulgação de conhecimentos entre pares e me aventurava ao contexto da divulgação ao público em geral. Trazia do congresso alguns questionamentos, como por exemplo: como trabalhar a questão ambiental na formação docente? Como trabalhar por meio de cenários e estratégias didáticas que envolvem ativamente os estudantes? Em que sentido é importante levar a discussão da problemática ambiental ao ensino de ciências? E estas reflexões eu fazia considerando tanto o nosso estudante de nível superior quanto os estudantes da escola básica, público principal da exposição.
Além disso, eu tinha como premissa que a participação na SNCT oportuniza que futuros biólogos trabalhem juntos, pensando em atividades que permitem a articulação entre diferentes conhecimentos, científicos, pedagógicos, políticos etc., gerando uma contribuição positiva ao processo de formação do biólogo em geral, não só os futuros docentes… Para os estudantes da escola básica, penso que a SNCT gera um chamamento inicial à ciência. Deste modo, viver a exposição, foi para mim mais uma oportunidade de reflexão sobre este processo…o que expressarei brevemente nas seguintes linhas…
…Os estudantes estavam animados, eu podia ver em seus olhos…estavam ansiosos como eu… e também como eu, suponho que estavam felizes com mais esta ação de integração entre universidade e escola que laboratório se propunha a realizar. Mas muito trabalho nos esperava naquela tarde de início da semana e tivemos o desafio de transformar pilhas de caixas, equipamentos soltos, banners, pincéis e papéis em uma exposição coerente e atrativa para os visitantes. Era um desafio porque sempre há o novo e o inesperado na montagem e execução, mas era um desafio de certo modo controlado, pois tivemos um bom tempo de planejamento nos meses anteriores, tivemos parcerias com duas escolas que nos ajudaram nas escolhas das atividades, treinamento e envolvimento já com os alunos da escola básica. Desde modo, e somado ao fato das vantagens do trabalho em equipe, montamos a exposição.
Nos dias que se seguiram recebemos muitos estudantes, professores e comunidade da universidade na nossa exposição. As escolas não paravam de chegar, de manhã e de tarde, estudantes de diferentes faixas etárias, com diferentes interesses…
Recebemos elogios pelo trabalho realizado e sugestões de aprimoramento das ações. Também recebemos muitooo carinho e empolgação do público visitante. Estar ali e observar como nossos estudantes interagem com o público visitante, que estratégias didáticas utilizam para discutir conhecimentos que são produzidos no laboratório, que estratégias utilizam para “conquistar” o público e fazer com eles se interessem sobre o tema foi uma experiência importante para mim. Faz-me valorizar a prática como componente formativo, que já é parte do projeto pedagógico do curso de Ciências Biológicas e a necessidade de diálogo entre conhecimentos pedagógicos do conteúdo e conhecimentos do conteúdo.
A construção e execução da proposta da exposição
Nossa exposição mobilizou todo o laboratório em ações de (i) planejamento: adaptação de atividades, seleção das amostras e equipamentos, elaboração de uma concepção pedagógica para a exposição; (ii) execução: montagem, recepção do público e desmontagem da exposição e (iii) avaliação – realizada também pelos professores das escolas em que atuamos em parceria.
A exposição discutiu de forma lúdica e dinâmica a água na nossa sociedade, partindo do pressuposto que a água é um elemento essencial para a vida não só humana, mas de todos os seres vivos, sendo um bem de uso público e passível de gestão. Elaboramos uma instalação de uma lagoa que mostrou a biodiversidade existente em lagoas costeiras do Brasil e usos humanos dos ambientes aquáticos. Os visitantes puderam simular a entrada em uma lagoa costeira e observar organismos presentes, plantas aquáticas existentes discutindo conhecimentos de como se estruturam os ambientes lacustres. Além disso, participaram de atividades de adivinhação, música e jogos possibilitando contato com as diferentes questões que envolvem a água nos ecossistemas aquáticos e na sociedade. A mostra também buscou a possibilidade de reflexão junto aos visitantes sobre fatores que geram perda de biodiversidade dos ecossistemas aquáticos, tais como, degradação de habitats, espécies invasoras, poluição química e orgânica, entre outros. De modo a fazer uma exposição inclusiva, buscamos explorar nas atividades diferentes sentidos como paladar, tato, visão e audição.
Foram questões importantes durante a elaboração da exposição:
- Manter a identidade do laboratório de limnologia na SNCT e estar integrado ao tema central e ao tema do Instituto de Biologia;
- Fazer uma abordagem interdisciplinar sobre as questões da água;
- Trabalhar de forma inclusiva;
- Realizar nas escolas, em que atuamos em parceria, ações antes e após a SNCT de modo a promover uma integração curricular dos temas trabalhados na exposição.
Tivemos um total de 2387 visitantes registrados, o que representou um aumento de 36% com relação aos visitantes do ano passado. Tivemos muitos estudantes da educação infantil, ensino fundamental e educação de jovens e adultos além de estudantes, professores e funcionários da própria universidade.
Mas como está o copo d´água? Meio cheio ou meio vazio?
É claro que como parte da reflexão, nos cabe apontar demandas e desafios que ainda não alcançamos e que vem com a bandeira e discussão das atividades extensionistas na universidade. Recentemente, e parte de um estudo realizado por minha estudante de mestrado Sama de Freitas Juliani, temos discutido avanços nas atividades de extensão da universidade. Em um trabalho apresentado no V Encontro Nacional de Ensino de Biologia e II Encontro Regional de Ensino de Biologia da Regional 01, discutimos que com a promulgação da constituição de 1988 as relações entre ensino, pesquisa e extensão universitárias foram estruturadas através do princípio de indissociabilidade e que atualmente podemos vislumbrar um esforço em estimular sua a operacionalização através do fomento a ações extensionistas. Políticas recentes preveem a publicação de editais para o financiamento de projetos de extensão (por exemplo, o Programa Apoio a Projetos de Extensão e Pesquisa, o PROGRAMA DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA MEC/SESu), em nível de eventos, temos o Congresso Brasileiro de Extensão Universitária entre outros. Especificamente na UFRJ também encontramos um movimento de resgate e valorização da extensão através dos editais da pró-reitoria de extensão (PR5) de bolsas de iniciação científica para participação em projetos de extensão (PIBEX), o congresso de extensão da UFRJ, o fomento à SNCT entre outras ações institucionais.
Contudo, apesar de tais avanços, os desafios são grandes… estamos em um momento de operacionalizar a creditação das ações extensionistas, política de 2001 do Plano Nacional da Educação, que somente em 2013 é regulamentada pela UFRJ. E os desafios para a própria realização das atividades extensionistas, pois sabemos que tais ações ainda são repletas de dificuldades, por exemplo, nas atividades da SNCT, temos orçamentos baixos, falta de um espaço permanente com infraestrutura adequada para a realização das atividades etc. e isso nos coloca frente a novos desafios. Se entendemos esta ação de divulgação como uma ação positiva de integração entre universidade e escola, se os nossos estudantes estão ativamente envolvidos no processo de ensinar e aprender, se há um chamamento à ciência por meio de sua divulgação, porque não investimos mais na extensão como um componente formativo?
Parabéns a todos os envolvidos e à sua liderança Laísa. Já não falo mais em sonho. É pura realidade. Mas o caminho da extensão, como a queremos será longo. O pé já está na estrada e aponta para a frente. Simbora refletindo sobre o caminhar…daqui a pouco será certeza e cotidiano.