Particularmente eu considero música algo extraordinário. A música é capaz de desencadear os mais sinceros sentimentos, sem filtros. Ela transcende tempo, distâncias e as mais diferentes culturas. Quem nunca ouviu uma música e subitamente sofreu com a nostalgia que ela trouxe inserida?
Os ecossistemas são verdadeiros musicais, com seus atores e diálogos cantados. Sua sonoridade é o conjunto de todos os sons emitidos biológicamente e geológicamente. Por exemplo, alguns animais são capazes de emitir sons para garantir a seleção de machos, para interação predador-presa e na marcação de território. Este ano saiu um artigo na Nature Communications (Suraci, 2016), o qual mostrou os efeitos que o medo poderia ter sobre uma cascata trófica. O “medo” foi caracterizado pela gravação de uivos de lobo, há tempos extintos do local, e foi o suficiente para diminuir o tempo de caça dos predadores de topo atuais. A sonoridade emitida por estes carnívoros de grande porte, foi apenas uma ferramenta para estudo do medo, no entanto a idéia de unir dois ramos da ciência como a sonoridade e a ecologia parece bem interessante, não?
Eis que surgiu uma área, relativamente nova, chamada de Soundscape Ecology (Ecologia da Paisagem Sonora). Esta é definida por Truax (1978) como: O estudo dos efeitos da sonoridade ambiental sobre as respostas físicas ou comportamentais dos que ali vivem. Atualmente a fragmentação de habitats e as mudanças climáticas são os principais distúrbios das paisagens e ameaças à biodiversidade. Neste contexto, entender por exemplo como as mudanças climáticas alterariam os padrões biofônicos de uma paisagem, é algo que a Ecologia da Paisagem Sonora busca entender. Já se sabe que mudanças na temperatura tem influência na fenologia e até mesmo o ciclo circadiano de alguns animais. Estas mudanças poderiam então alterar a idade ou o momento do dia em que um anuro vocalizaria.
Bem, falamos da biofonia e da geofonia mas parece que falta uma peça importante neste conjunto sonoro: o ser humano. Afinal quer influência na sonoridade de um espaço mais direta que uma cidade? São prédios, carros, buzinas, asfalto, etc. De amplitudes e frequências diferentes das encontradas em ambientes naturais. Afinal, o som de uma gota de chuva ao bater em um telhado é diferente do som da gota que cai na grama. O gráfico abaixo foi retirado do Pijanowski (2011) e mostra um modelo conceitual da variação sonora ao longo de um gradiente de distúrbio antropogênico. A tendência geral da biofonia e da geofonia é diminuir com o aumento do distúrbio.
Na publicação Somos muitos rios, a Lúcia Sanches ressalta as alterações realizadas em grande parte dos corpos hídricos que existiram ou ainda resistem na cidade do Rio de Janeiro. Muitos destes córregos retificados, assoreados, poluídos ou simplesmente tampados, já foram ou estão em processo de serem silenciados. Este silenciamento se mostra preocupante, quando trabalhos como o de Ficken e colaboradores (1974) evidenciam que o ato de piar é de fato mais comum em pássaros que cantam ao longo de córregos.
Fica então o questionamento: seria a sonoridade do mundo uma composição indeterminada, a qual nós não temos controle, ou seriamos nós compositores e performáticos, responsáveis por sua forma? Se temos controle ou não, nós vivemos de forma direta e indireta as consequências das alterações sonoras. Você já parou para pensar por que muitas pessoas se sentem bem ao ouvir o barulho da chuva? Por que existem diversas terapias com fontes de água? Por que um banho de cachoeira ou de rio é tido como energizante?
Estas perguntas não vão ser respondidas até o fim dessa publicação, mas são perguntas que evidenciam a água como um serviço ecossistêmico potencialmente importante para o bem estar e a saúde humana. Assim, a Ecologia da Paisagem Sonora busca mostrar a importância da conservação ambiental, através da valorização destas sonoridade locais. Se você nunca parou para pensar nisso, tente tirar um cochilo numa rede ouvindo rainymood.com e reflita sobre a qualidade do seu sono.
Muito legal, Iamê! É uma área emergente e me parece muito promissora. Esse questionamento é complexo, mas acredito que somos responsáveis em parte pela sonoridade do mundo, e parece que essa responsabilidade ganha mais peso à medida que o homem vem modificando e degradando cada vez mais as diversas paisagens naturais. E se nosso potencial de sermos grandes perturbadores conforme nos aproximamos de áreas urbanas aumenta, como podemos refletir e agir para amenizar esse padrão? Será possível? É um desafio, mas acho extremamente importante começarmos a aprender mais sobre isso. E rainymood.com é espetacular! Incrível como o humor é moldado e você sente uma leveza….é bom até para focar nos estudos!