As lagoas costeiras (Figura 1) são ecossistemas que apresentam grande importância para o ser humano em função de uma série de serviços, como: lazer, controle de inundações, recepção de esgoto doméstico e rejeito industrial, beleza cênica e harmonia paisagística; podendo valorizar a região geográfica em que se encontra. Apesar de serem encontradas em toda costa brasileira, sua presença se destaca nos estados do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul.
Figura 1: Lagoas costeiras do litoral norte do estado do Rio de janeiro: (a) Imboassica, lagoa impactada localizada na região metropolitana de Macaé/ (b) Cabiúnas, localizada relativamente preservada, localizado no PARNA de Jurubatiba; (c) Comprida, lagoa bem preservada localizada no PARNA de Jurubatiba; (d) Carapebus, lagoa sujeita a impactos, localizada no PARNA de Jurubatiba
Essas ações desenvolvidas nas lagoas costeiras podem modificar esses ecossistemas, acarretando consideráveis perdas quanto às questões ecológicas, sanitárias, sociais e econômicas. Um exemplo são as lagoas costeiras do litoral norte do estado do Rio de Janeiro. Essas lagoas apresentam um impressionante espectro de variação dos valores de salinidade, além da quantidade e qualidade de matéria orgânica (MO), observado pelo gradiente de coloração das suas águas, variando de um amarelo claro a um marrom intenso (coloração de chá).
Tais características conferem às lagoas costeiras do norte do estado do Rio Janeiro importância socioeconômica e ecológica bastante relevante, tornando-as importantes laboratórios para estudos ecológicos e biogeoquímicos. Estes estudos possibilitam o entendimento de diversas alterações em processos naturais sujeitos às ações antrópicas, ou seja, ações relacionadas a atividades humanas.
Dentre os impactos a que esses ecossistemas estão sujeitos, um dos mais relevantes quanto à alteração da qualidade da água e perda de qualidade ecológica, é o lançamento de esgoto sem tratamento. Com o aporte de nutrientes em grandes quantidades, presentes no esgoto, principalmente sob a forma de nitrogênio (N) e de fósforo (P), frequentemente se observa a ocorrência do processo de eutrofização artificial. Nessas condições, tende a ocorrer quebra relativa da estabilidade do ecossistema. Profundas mudanças no metabolismo de todo o ecossistema acompanham esse desequilíbrio ecológico, como:
- Provocar de imediato um efeito sobre a densidade da comunidade fitoplanctônica (algas microscópicas), ou seja, sua intensa proliferação (Figura 2). Nos ambientes tropicais, esse efeito se potencializa, pois não existe limitação de luz ou temperatura o ano todo, condições essenciais para o desenvolvimento destes organismos;
- No caso de ambientes rasos, como as lagoas costeiras, além da comunidade fitoplanctônica, pode-se observar considerável efeito sobre a comunidade de macrófitas aquáticas (plantas aquáticas – Figura 3).
Figura 2: Atividade de monitoramento na lagoa Imboassica. Pode-se observar o aumento da densidade da comunidade fitoplanctônica, em função do aumento da turbidez da água e a coloração verde característica.
Figura 3: Banco da macrófita aquática conhecida como Taboa (Typha domingensis).
Nos estágios iniciais, esse efeito poderá ser positivo. Mas, nos estágios avançados, a produção de algas filamentosas pode reduzir a penetração de luz, limitando o crescimento das macrófitas aquáticas. Os detritos, tanto de origem fitoplanctônica – principalmente as filamentosas – como das macrófitas aquáticas, alteram a composição do sedimento, tornando-o mais orgânica. Com o sedimento mais orgânico, ocorrem alterações biológicas consideráveis. Estas mudanças promovem uma intensificação dos processos redutores, ou seja, sem a presença de oxigênio (O2). Através da decomposição da matéria orgânica originada dos detritos, começam a ocorrer os processos anaeróbicos (sem oxigênio). Nessas condições, aumentam as concentrações de gases como o metano e o gás sulfídrico na interface sedimento-água. Este último responsável pelos odores característicos de ovo podre.
Esses ecossistemas aquáticos são estudados de forma sistemática desde o início da década de 1980. Mas a partir do final da década de 1990, iniciaram-se os primeiros trabalhos voltados para a temática dos gases causadores do efeito estufa, principalmente o metano e o dióxido de carbono. Muitos destes estudos foram realizados em diferentes programas de pós-graduação no estado do Rio de Janeiro, como mecanismos de obtenção de títulos de doutorado e mestrado. Destaca-se a importância desses programas, uma vez que os profissionais formados continuam desenvolvendo pesquisas em diversas instituições pelo Brasil.
Os estudos realizados nas lagoas costeiras localizadas na região metropolitana de Macaé e no Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba (Figura 1), observaram que a eutrofização artificial potencializa a emissão de metano (CH4) para a atmosfera. A emissão de CH4 é de extrema importância com relação efeito estufa, em função da sua elevada absorção da radiação infravermelha (IV), 25 vezes maior que o dióxido de carbono (CO2). A eutrofização provoca significativas alterações no metabolismo das lagoas costeiras, potencializando a incorporação ou a emissão de carbono para a atmosfera, na forma de CO2 e CH4 (Figura 4). No entanto, a dinâmica do CO2 nos ecossistemas aquáticos continentais é bastante complexa. Novos estudos são necessários para a melhor compreensão de seus fatores controladores com relação ao CO2.
Figura 4 – Balanço entre a incorporação e a emissão de CO2 e CH4 em ecossistemas aquáticos continentais.
Esses resultados servem como alerta frente o quadro relativo ao saneamento básico no Brasil. Além de todas as outras preocupações quanto a questões sanitárias e ecológicas, estes estudos apontam para a importância de um manejo adequado destes ambientes, através do tratamento do esgoto e seu devido destino, minimizando a emissão de gases estufas, principalmente CO2 e CH4.
Bibliografia
www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb
Marinho, C.C.; Fonseca, A.L.S.; Esteves, F.A. Impactos antrópicos nas lagoas costeiras do norte do estado do Rio de Janeiro: uma revisão sobre a eutrofização artificial e gases de efeito estufa. RBPG, Brasília, v.13, n.32, p. 703 – 728, set./dez. 2016