A teoria do rio contínuo de 1980, muito utilizada para explicar a dinâmica de distribuição das comunidades bentônicas (como podemos rever na publicação Macroinvertebrados fantásticos e funções nos rios em que habitam) e o fluxo de energia, principalmente nas disciplinas da graduação em Ciências Biológicas. Tal teoria utiliza como modelo um rio simples, que considera apenas a dimensão longitudinal desconsiderando as demais dimensões além da temporalidade que inclui a heterodinâmica do rio. Porém, um rio real possui outras dimensões onde ocorre o fluxo de energia no ecossistema.
A imagem traz informações das dimensões que contemplam o fluxo de energia do riacho:
1- Dimensão lateral:
Zona ripária (riparian zone), planície de inundação (flood plain) e canal do rio
2- Dimensão longitudinal:
Ligação montante-jusante
3- Dimensão vertical:
Região hiporreica (hyporheic zone)
Apesar de Vannote considerar em sua teoria apenas a dimensão longitudinal, seu trabalho serviu de “pontapé inicial” para outros pesquisadores como Junk et al. (1989) com The flood pulse concept in river Floodplain Systems, cujo enfoque principal são as interações laterais nos sistemas rio-planície de inundação dos rios tropicais, a produção de biomassa e a ciclagem de nutrientes que ocorre na área alagável da planície. A periodicidade do ciclo hidrológico na planície de inundação influencia a produtividade aquática (positivamente) e os processos ecológicos, em decorrência das trocas com as áreas laterais da planície de inundação. Assim, diferindo do contínuo fluvial onde o comportamento previsto as comunidades encontram se organizadas no eixo longitudinal de forma a maximizarem os materiais e a energia transportados gradiente abaixo.
Nos rios com planície de inundação, os eventos de inundação determinam grandes mudanças em toda a bacia hidrográfica. Entretanto, dependendo do uso de solo nas proximidades de rio, material contaminante (fertilizantes, pesticidas) pode ser lixiviado para o corpo d’água e alterar os processos ecossistêmicos.
Posteriormente, quase que concomitantemente, Elwood et al. (1983) e Newbold et al. (1985) vem com nutrient spiralling concept, ou Teoria do espiralamento de nutrientes, onde os nutrientes nos sistemas lóticos não sofrem uma verdadeira ciclagem em um determinado lugar, como acontece nos sistemas terrestres, devido ao contínuo movimento da água e dos materiais particulados rio abaixo.
Este conceito tem sido reconhecido como bastante útil para descrever a dinâmica de nutrientes em sistemas lóticos, onde ocorre um transporte contínuo e unidirecional de nutrientes. O átomo de qualquer nutriente viajaria rio abaixo até uma certa distância que fosse incorporado no material particulado.
Outra teoria foi de Stanford e Ward (1993) com An ecosystem perspective of alluvial rivers: connectivity and the hyporheic corridor que trata da importância do pulso de inundação e da zona hiporreica no fluxo de energia do sistema. Já em 1999 chega o grande David R. Montgomery com Process domains and the river continuum, que se trata de uma alternativa à teoria de Vannote pois considera outras dimensões e processos geomorfológicos na variabilidade espacial e temporal que ocorre nos ecossistemas aquáticos como, lençol freático, longitudinal lateral, vertical e tempo canal do rio.
Esse é um pequeno apanhado de teorias que vieram posteriori a Vannote e que possuem aplicabilidades distintas dependendo da pergunta que está querendo responder. Essa dissecação e aprofundamento da teoria do rio continuo são pouco ou mesmo nunca estudadas na graduação em disciplinas obrigatórias, mas elas existem e são utilizadas em pesquisas acadêmicas, aulas em cursos específicos de ecologia de ecossistemas aquáticos, apresentações em palestras, minicursos em semanas acadêmicas, e porque não aqui, no blog de limnologia?!
O trabalho seminal de Vannote tem extrema relevância e mérito, mas como todo conceito em ciência vai sendo aprimorado a partir da contribuição de outros pesquisadores e novos dados. Assim que andamos para frente e acumulamos conhecimento para melhor entender (e explicar) os fenômenos ao nosso redor. Se são bastardos ou filhos legítimos deixo para o próprio Vannote responder… Para mim são cientistas que contribuíram bastante para aprimorar a teoria e são, por muitas vezes, esquecidos.