Os produtos de limpeza e sanitização, são importantes aliados para o combate a contaminação de patógenos presentes por toda parte (Ver figura a seguir). Estes produtos são extremamente diversos, apresentando uma série de substâncias químicas, de origem animal, vegetal ou sintéticos. Hoje temos produtos pra todo tipo de sujeira ou contaminação. Por isso, apresentam um amplo espectro de ação no ambiente. Então, depois de finalizarmos nossas tarefas de limpeza e/ou descontaminação, ao abrirmos a torneira, ralo abaixo estes produtos seguem seu caminho. E aí? Para onde estão indo? Qual controle sobre seu destino final? Bom. Deveriam ser encaminhados para estações de tratamento de esgoto (ETE). Mas, segundo a Agencia Nacional de Águas (ANA), “Como muitos municípios não possuem tratamento de esgotos adequado ou sequer disponibilizam o serviço para sua população, o lançamento desses efluentes nos corpos hídricos comprometem a qualidade e os usos das águas, causando implicações danosas à saúde pública e ao equilíbrio do meio ambiente.” Por isso, vamos dar uma olhada nas principais substâncias presentes nos produtos de limpeza e desinfecção, e os impactos causados ao meio ambiente.
– Sabões e detergentes: Conhecidos como tensoativos, por reduzir a tensão superficial da água, apresentam ácidos graxos derivados de óleos e gorduras, soda cáustica, além de sais diversos. Originariamente conhecido como reação de saponificação, historiadores relatam sobre a produção de sabão através da mistura de gordura de origem animal e cinzas. Depois foram sendo aperfeiçoados os processos, sendo utilizados álcalis mais efetivos, sendo o mais comum a soda cáustica (hidróxido de sódio), reagindo com óleos ou gorduras de origem animal ou vegetal.
Reação de saponificação.
Para solucionar problemas com relação a ação de sabões em água dura (ricas em sais de cálcio e magnésio), onde não conseguem fazer espuma, foram criados os detergentes sintéticos. Mas, em geral, os detergentes apresentavam uma menor biodegradabilidade (ação dos microrganismos quanto a decomposição dos compostos na natureza). O que proporcionava seu acumulo nos corpos d´água, favorecendo a produção de grandes quantidade de espuma.
Figura: Espuma de detergente nas águas do rio Tiête.
(Fonte: https://docplayer.com.br/68239122-Saboes-e-detergentes.html)
Por isso, foram criados detergentes que apresentam uma maior biodegradabilidade no meio ambiente (ver figura a seguir). Mas além da biodegradabilidade, outro aspecto relevante, é que os sabões utilizam matéria prima renovável, os óleos e gorduras, apesar de serem agentes tensoativos menos eficazes.
Reação de Biodegradação aeróbica do Alquilbenzeno sulfonato linear (LAS) (Fonte: file:///C:/Users/claud/Downloads/31068.pdf)
Outro evento relevante refere-se ao processo de eutrofização artificial (aporte de nutrientes que leva ao aumento da produção de matéria orgânica, via formação de algas) destes mesmos corpos d´água. Em função do uso de compostos ricos em fósforo, como os tripolifosfatos, utilizados nos sabões em pó. O enriquecimento por fósforo leva a proliferação de algas. Tais algas podem provocar uma série de problemas, como o aumento da produção de matéria orgânica, aumentando o consumo de oxigênio, além da produção de substâncias tóxicas e/ou indesejáveis. Lembram da geosmina? (https://limnonews.wordpress.com/2020/01/18/agua-de-geosmina-vai/)
Figura: Tripolifosfato
(Fonte: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422001000500019).
O aumento do consumo de oxigênio nos corpos d´água tendem a levar estes ambientes a anaerobiose, ou seja, ausência de oxigênio. Em condições anaeróbicas ocorre a produção de gases como, H2S (sulfeto de hidrogênio) e NH3 (amônia) e CH4 (metano). Sendo este último um dos principais gases estufa.
O aporte de sabões e detergentes promovem alterações na acidez da água, alterando o metabolismos do ambiente, além de influenciar o equilíbrio dos compostos químicos. Como são substâncias tensoativas, provocam também a modificação na tensão superficial da água, uma importante característica da água, para alguns organismos que vivem na superfície dos corpos d´água. A diminuição da tensão superficial impede que estes organismos se desloquem na superfície da água.
– Sais Quaternários de Amônia: São substâncias produzidas através da substituição dos átomos de hidrogênio (H) do íon amônio (NH4+) por radicais orgânicos arilas ou alquilas (Rn). Estes compostos apresentam ampla utilização para preparação de cosméticos, fármacos e desinfetantes, podendo apresentar ação detergente, umectante, germicida, emulsificantes e antissépticos. Como sua ação germicida pode ser inativada pela presença de matéria orgânica, em geral, apresenta uma baixa toxicidade no meio ambiente. Mas apresenta ação tensoativa, o que pode provocar efeitos sobre a tensão superficial dos corpos d´água.
– Água Sanitária: De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), água sanitária conisiste em: “Soluções aquosas à base de hipoclorito de sódio ou cálcio, com teor de cloro ativo entre 2,0 a 2,5% p/p, durante o prazo de validade (máximo de 6 meses). Produto poderá conter apenas hidróxido de sódio ou cálcio, cloreto de sódio ou cálcio e carbonato de sódio ou cálcio como estabilizante. Pode ter ação como alvejante e de desinfetante de uso geral.” Em função de seu baixo custo e sua eficiente ação germicida, a água sanitária tem sido uma solução utilizada em tempos de pandemia. Mas sua ação só é eficiente quando diluída corretamente, ou seja, 25ml para um litro de água. O uso indiscriminado de água sanitária pode provocar uma série de impactos nos corpos d´água. Em função de sua ação oxidante, pode atuar de duas formas: (1) danificando a parede celular ou a proteína dos organismos; (2) reagindo com a matéria orgânica presente nos corpos d´água, formando uma série de substâncias tóxicas.
Dentre estas substâncias tóxicas, temos os trihalometanos (THM) e as cloroaminas.
A
B
Formação dos THM (A) e das cloroaminas (B). (Fonte: Meyer 1994 Caderno de Saúde Pública.)
É importante ressaltar algumas alternativas para reduzir os impactos ao meio ambiente, provocados pelos produtos de limpeza e/ou de higenização, como:
- Utilizar com moderação. Observe as orientações quanto a quantidade. O exagero não garante melhoria na eficiência, pelo contrário, podemos inibir a ação das substâncias quando utilizadas em excesso;
- Ação física, ou seja, remoção da sujeira através do uso de esponjas, escovas, palhas de aço e outros utensílios. O uso de produtos químicos auxilia a remoção da sujeira, mas a ação física remove a maior parte do material;
- Uso de água quente. O aumento da temperatura auxilia na remoção de matéria orgânica, principalmente aquelas aderidas a superfícies;
- Uso de produtos alternativos, a base de substâncias como suco de limão, bicarbonato, vinagre, álcool e amônia, entre outros. Segue algumas das “receitas” sugeridas por Instituições de Ensino e Pesquisa, que além de serem mais corretas ecologicamente, em função do baixo custo, auxiliam na redução do orçamento.
Receitas de Produtos de Limpeza Ecológicos ou Caseiras:
https://www.fca.unesp.br/Home/Extensao/GrupoTimbo/RECEITASDEPRODUTOSDELIMPEZAECOLOGICOS.pdf
https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/235/6468/1/21128059.pdf
http://www.ufcg.edu.br/revistasaudeeciencia/index.php/RSC-UFCG/article/viewFile/171/108
https://www.mma.gov.br/estruturas/a3p/_arquivos/prod_limpeza.pdf
Então não se esqueça. Precisamos nos preocupar com a condição de higiene porta pra dentro. Mas vamos minimizar os impactos causados com o que vai ralo a baixo. Não apenas no manuseio dos produtos de limpeza em nossos domicílios. Mas também pela consciência política, buscando mudanças na gestão pública quanto a questões de saneamento e meio ambiente. Já comentamos sobre a falta de Estações de Tratamento de Esgoto? E muitas das estações instaladas estão inoperantes. Por isso, nossas atitudes não podem estar dissociadas de questões sociais, econômicas e ambientais, senão, ralo a baixo vai também, nossa dignidade e nosso futuro num planeta com hábitos mais sustentáveis.
Links relacionados:
http://atlasesgotos.ana.gov.br/
http://www.abq.org.br/cbq/2012/trabalhos/5/1571-10278.html
https://www.chemax.com.br/quaternario-amonio
https://www.ufmt.br/hujm/arquivos/ab4e9cdaa4867a9a9a935a270a69a0c9.pdf
https://limnonews.wordpress.com/2020/04/04/ta-limpo-mas-ta-liberado/
https://www.uniube.br/eventos/entec/2011/arquivos/quimica2.pdf
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422001000500019
Boa Cláudio, muito do que mandamos ralo abaixo tem a ver como nos guiamos acima dos ralos, na vida a fora.