O laboratório de limnologia sempre foi sinônimo de amizade, companheirismo, abraços, sorrisos e muitas conversas descontraídas (principalmente quando estamos segurando uma xícara de café). Sempre tive uma forte impressão de que o contato com meus companheiros de trabalho era uma parte importante do meu dia. Receber e doar carinho sempre foi algo gratuito entre todos. Toda a afetividade encontrada na atmosfera desse laboratório se estende para além de suas paredes: Bandejão, lanchonete-do-carinha-que-vende-comida-japonesa, que também é a mesma lanchonete-do-carinha-que-vende-açaí, ponto do BRT etc. Como diz o livro sagrado da Limnologia: “Em todos os cantos do fundão, onde houver dois ou mais limnólogos reunidos, ali a alegria estará presente” (Chico capítulo 7). Brincadeiras à parte, o dia a dia no laboratório proporcionou com que construíssemos laços fortes de carinho, amizade e muita cumplicidade.
Um dos momentos em que nos reunimos e interagimos como grupo é o Workshop de limnologia, o qual ocorre uma ou duas vezes ao ano. Toda a animação gerada em torno do workshop ocorre muito antes do workshop em si. Para as pessoas que vão do Rio para Macaé, a aventura começa no ônibus que nos leva até o NUPEM. Primeiramente, sempre há aquela “agradável” espera pelos atrasados. Quando alguém atrasado finalmente chega, ouvimos a famosa frase do professor Reinaldo (seguida de um sorriso cômico): “Fulano, estávamos SOMENTE esperando você”. E a mesma frase é repetida para os próximos atrasados! Além disso, seria maçante as 5 horas de deslocamento para o NUPEM (Macaé) se não houvesse o grupo de música mais coeso que fica localizado na região do fundo do ônibus. Seu repertório sempre agrada a todos, principalmente depois de cantar 20 vezes o aclamado hit “madrugada, sou DALILA”, uma versão nossa de “Beijo sem” (Marisa Montes).
Os principais motivos para a realização do workshop são: a possibilidade de discutir ciência, discutir ideias e falar sobre a logística do laboratório, além de ser uma ótima ocasião para nos divertirmos. Será que os motivos que acabei de relatar estão na minha ordem de preferência? Você jamais saberá! Claro que devemos discutir sobre projetos e todas as coisas que nortearão as ações do laboratório, mas o ponto máximo do workshop é a nossa integração ao final da reunião. Digo “integração” e não “festa” para que não denominem de “balbúrdia” um momento tão agradável e importante para nós. Eu vejo que a nossa integração é um momento muito singular na nossa trajetória dentro do laboratório de limnologia onde entramos em contato com o lado mais descontraído de nossos colegas e professores, o que possibilita conversas mais fluidas sobre ideias, projetos, esclarecimentos de dúvidas etc.
Mas como fica a nossa integração nesse cenário atual de pandemia por conta do COVID-19, onde o isolamento social se faz necessário? Como ficam os momentos de contato, de descontração e de risadas? Como ficam as nossas discussões sobre as particularidades do laboratório, planos recentes e futuros? Realizar o workshop parecia ser um desafio, mas devido a importância desse evento nos propomos a organizar essa reunião no formato à distância. No dia 31 de julho de 2020 realizamos a nossa primeira versão remota do workshop. Ao invés de toda a logística necessária de transporte, alojamento, alimentação, uma equipe se mobilizou para organizar toda a programação e o modo como a reunião ocorreria. Muita coisa foi pensada para proporcionar os momentos de interação como, por exemplo, a divisão dos participantes em pequenos grupos para discussões, propostas de reflexões sobre temas atuais e até gincanas. Mas não quero me prender ao que foi realizado e sim nas minhas percepções e sentimentos em relação a esse workshop.
Primeiramente, a empolgação que antecede o workshop estava presente. Poucas horas antes de iniciar o workshop reparamos nas mensagens que chegavam nos grupos de WhatsApp lembrando das músicas que são cantadas no trajeto do Rio até Macaé. Um vídeo do último workshop foi enviado onde reparamos uma versão moderna de “É Tarde Demais” um dos clássicos de Raça-Negra. Fui transportado para aquele vídeo e reparo no sorriso largo que se abre em meu rosto. Será que eu gostaria de estar naquele ônibus cantando aquela música? Com certeza. Não só essa. Queria cantar “madrugada sou DALILA” 20 vezes, no mínimo! Apesar de não estar no ônibus e não estar fisicamente com meus companheiros, a alegria permaneceu presente somente em relembrar dessa cena e poder compartilhar as risadas com os amigos.
No momento da reunião, enquanto aguardávamos a chegada de todos, eu pude notar as conversas descontraídas, principalmente por parte dos professores. Reparei que as pessoas falavam com um sorriso no rosto, mostrando o quanto esse momento de contato com as pessoas do laboratório é um momento prazeroso. Vale ressaltar um pequeno solo de piano realizado pelo professor Reinaldo. A música “Cai, cai balão” nunca foi tão aplaudida. Após esse momento de descontração, foi dado o início da reunião. A reunião foi mediada e organizada pela brilhante aluna de iniciação científica Luiza Costa que, com muita maestria, conduziu toda a pauta além de comandar a logística dos processos remotos. Pude perceber, pela atitude da Luiza e dos demais envolvidos, o quanto essa reunião é importante para as pessoas do laboratório e como as pessoas mais novas estimam esse momento. Foi lindo ver o empenho de todos.
Como dito anteriormente, para proporcionar maior interação entre os participantes, os mesmos foram divididos em grupos menores. O objetivo principal era para que cada um pudesse expor as suas dificuldades e problemas em relação ao isolamento social. Esse momento de conversa em grupos pequenos também é algo habitual do workshop onde conseguimos expressar de forma mais íntima as nossas sensações, pensamentos e sugestões. Os sentimentos e ideias que foram expostas foram sintetizadas e transmitidas ao grupo maior por um representante. A união das experiências de todos foi discutida no âmbito do grupo maior, para termos uma ideia geral como os integrantes do laboratório têm se sentido durante o isolamento.
Além disso, uma interessante conversa foi proporcionada pelos pós-doutorandos do laboratório onde eles se colocaram à disposição para ajudar os alunos. Esse apoio é fundamental, principalmente nesse período onde muitos alunos se encontram desmotivados e vulneráveis. Mais uma vez, o workshop foi utilizado para passar essa mensagem de companheirismo e para mostrar que os alunos não estão sozinhos e que, além de seus orientadores, eles podem contar com a experiência daqueles que já estiveram em seus lugares.
Após algumas discussões interessantes, o workshop se encerrou. Mas workshop que é workshop não se encerra assim. Claro que houve a esperada “integração”, com direito a gincana, quiz e correio elegante. Os mais ousados se caracterizaram com roupas típicas das festas juninas. Outros, tecnologicamente mais avançados, utilizaram filtros na internet para ficarem mais caracterizados. Houve muito espaço para criatividade, conversas soltas, risos e muita alegria.
Neste momento de encerramento, eu retorno ao título desse texto. Será que o workshop perdeu alguma coisa com o isolamento social? Acho que isso depende muito de como cada um enxerga o momento que estamos passamos. Acredito que uma das principais coisas que esse isolamento me fez refletir é o significado de estar fisicamente perto de alguém e, de fato, estar conectado com as pessoas. É muito comum presenciarmos situações onde pessoas dividem casas e cômodos e quase não se olham, não conversam, não interagem. Então acredito que a conexão está mais relacionada com o compartilhamento de sentimentos e experiências do que, apenas, uma questão de aproximação física. Sendo assim, a essência do Workshop foi mantida mesmo tendo acontecido no formato remoto. Percebi isso através da descontração, da alegria, da empolgação presente em todas as atividades, discussões e em todas as brincadeiras que ocorreram. Claro que podemos sentir falta do contato físico, dos abraços, de olhar nos olhos, das sensações táteis que a presença de outra pessoa pode proporcionar. Mas a ausência dessas coisas não tirou a beleza e a descontração do nosso encontro.
Acho importante focar em todos os sentimentos bons que o contato remoto é capaz de proporcionar ao invés de destacar o que perdemos nesse período de distanciamento social. Como estamos em um país repleto de desigualdades sociais, nem todos têm acesso a tecnologias que possibilitam um contato com outras pessoas durante o isolamento. Em muitos casos, diversas pessoas não possuem o direito de praticar o isolamento de forma adequada. Por isso reforço o quanto foi bom conseguirmos realizar essa reunião de forma remota, podendo desfrutar de um contato social à distância. Pode não ser o ideal, mas é o possível. Sentimos falta do contato físico, mas eu aceitarei os abraços com juros quando chegar uma vacina. Até lá, desejo que todos compartilhemos sentimentos e experiências capazes de mostrar que não estamos completamente isolados.
Muito bom, Joseph! Compartilhar as experiências estéticas contribui para novas significações do evento!
Grande senso de observação Joseph. Bacana a valorização (Nova significação? kkk) do evento como um todo, mas principalmente de detalhes que acabam nos marcando a todos! E também muito importante esta visão positiva e responsável pela co-construção do evento…Obrigado.