Enquanto na semana passada nos aprofundamos nas características e particularidades dos habitantes microscópicos de rios e lagoas, desta vez trataremos de organismos de uma escala maior e que, com certeza, serão um pouco mais reconhecíveis. Apesar de não ser possível tratar de todos os grupos taxonômicos pertencentes à diversidade visível ao olho nu em um único texto, separamos dois grupos em particular que nos permitem exemplificar como ecossistemas aquáticos oferecem suporte e recursos para inúmeros tipos de animais e vegetais.
Dentre os diversos grupos sobre os quais poderíamos discorrer, temos os macroinvertebrados como um ótimo ponto de partida. Este conjunto de seres é extremamente plural, tendo como principal fator caracterizante a sua retenção em redes de 500 micrômetros (Hauer e Resh, 2017) e, portanto, abrange insetos, platelmintos, moluscos e outros organismos. Em especial, ao considerar o grupo dos insetos – que por si só já é extremamente rico em espécies e grupos taxonômicos – é importante lembrar dos diferentes estágios de vida e suas características particulares para coleta.


E como é feita essa coleta? De forma geral, grande parte dos macroinvertebrados em rios e outros ambientes lóticos vive associada ao sedimento e, portanto, pode ser classificada como bentônica. Utilizam-se então ferramentas como um amostrador de Surber (Fig. 2) para a captura dos organismos, agitando o sedimento e posicionando a ferramenta a favor da correnteza. Diferentes tipos de sedimento afetam esse processo e quais organismos serão coletados. Um sedimento formado unicamente por pedra e cascalho irá abrigar populações de macroinvertebrados distintas daquelas presentes em um solo arenoso coberto por matéria orgânica, por exemplo.

Após a coleta, a amostra de sedimento é tratada, separando o material inorgânico e orgânico dos organismos coletados. Os macroinvertebrados são então caracterizados até o menor nível taxonômico possível, por meio de chaves de identificação e observações sobre sua anatomia. A partir desse momento, os próximos passos serão definidos pelos objetivos principais de cada projeto científico e seu consequente objeto de estudo, mas ainda é possível destacar alguns dos principais usos gerais para os macroinvertebrados!

De maneira geral, esses organismos – assim como o zooplâncton e o fitoplâncton anteriormente – atuam como ótimos bioindicadores devido à sua sensibilidade e vulnerabilidade a mudanças nas variáveis abióticas de seus habitats. O índice EPT é apenas um exemplo de índice desenvolvido relacionando a abundância de organismos e a riqueza de táxons com a qualidade da água. Nele, a presença de táxons sensíveis à urbanização (Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera) é estudada, frequentemente em conjunto com outros grupos como quironômideos e membros da família Odonata (Martins, 2017). Curbícolas e outros filtradores também podem ser utilizados como mensuradores da presença de contaminantes, como metais pesados e compostos químicos, exemplificando mais uma utilidade dos macroinvertebrados em estudos limnológicos.

Em contrapartida e com uma perspectiva vegetal, podemos encontrar um grupo igualmente importante: as macrófitas! Estas são organismos fotossintetizantes visíveis a olho nu que vivem em contato permanente com a água, seja por meio de uma submersão parcial ou total. De maneira similar aos macroinvertebrados, o termo “macrófita” na realidade inclui diversos organismos diferentes, sejam eles angiospermas aquáticas, samambaias aquáticas ou até mesmo macroalgas.

Diante de sua classificação taxonômica heterogênea, torna-se necessário para seu estudo a caracterização adicional desses organismos em seus diferentes biótopos, ou seja, seus graus de adaptação ao meio aquático e seu consequente papel ecológico. Dentro dessa classificação, possuímos 5 tipos principais de macrófitas (Esteves, 2011):
- Emersas: São plantas aquáticas que possuem raízes fixas no sedimento e desenvolvem folhas e hastes que se projetam acima da superfície da água. Parte significativa de sua estrutura está exposta ao ar;
- Com folhas flutuantes: Essas plantas também se fixam ao fundo, mas suas folhas se estendem até a superfície, onde flutuam livremente;
- Submersas livres: Diferentemente das anteriores, essas plantas não se fixam no sedimento — ou o fazem de forma muito fraca, por meio de rizóides pouco desenvolvidos;
- Submersas enraizadas: São espécies que crescem completamente submersas, com raízes firmemente ancoradas no substrato. Todo o corpo se encontra submerso, mas pode desenvolver estruturas reprodutivas que alcançam a superfície;
- Flutuantes livres: São plantas que flutuam livremente sobre a superfície da água, sem estarem fixas ao fundo.

A coleta de macrófitas é realizada principalmente por meio de esforços manuais e uso de redes em campo, com a utilização de exsicatas para sua preservação e eventual identificação. Esse processo consiste no prensar de amostras vegetais e sua posterior secagem, garantindo a manutenção de seu formato semelhante ao estado vivo. É importante destacar que estes organismos fotossintetizantes possuem maior concentração de água em sua composição quando comparados a organismos terrestres, requerendo então mais cuidados durante a preparação de sua exsicata.

As macrófitas, de maneira geral, têm como uma de suas principais funções a estocagem de nutrientes por meio de sua produção primária. Sua capacidade fotossintética lhes confere um papel importante como base das cadeias tróficas, servindo de alimento para herbívoros e como fonte de detritos para vias alternativas de ciclagem da matéria orgânica. Essa capacidade produtiva também permite às macrófitas estocar contaminantes em sua biomassa, removendo-os do ambiente e possibilitando o manejo desses ecossistemas.
É evidente então que a análise de macroinvertebrados e de macrófitas aquáticas trata de conhecimentos fundamentais para o monitoramento e a gestão sustentável dos ambientes aquáticos continentais, mesmo sendo apenas uma porção da complexidade e da riqueza dos ecossistemas limnológicos.
Referências:
ESTEVES, F.A. Fundamentos de Limnologia, 3rd edn. Editora Interciência, Rio de Janeiro. 2011.
HAUER, F. R., & RESH, V. H. Macroinvertebrates. In Methods in Stream Ecology. Academic Press, v, 1, p. 297-319. 2017.
MARTINS, Renato T. et al. Effects of urbanization on stream benthic invertebrate communities in Central Amazon. Ecological indicators, v. 73, p. 480-491, 2017.







