No início do mês de Maio, em uma ilha no oceano pacífico, alguns nativos irão saltar de uma torre de madeira de 30 metros de altura, sem nenhum tipo de proteção, presos apenas por um par de cipós amarrados aos tornozelos. O evento parece ainda mais bárbaro ao se constatar que grande parte dos indivíduos em questão são crianças com menos de 10 anos. O que para nós parece uma cena absurda, trata-se de um costume secular praticado por habitantes da ilha de Pentecostes, na Republica de Vanatu. Tal proeza tem como objetivo garantir uma rica colheita de Inhame, e saltar é considerado um sinal de maturidade, masculinidade e ousadia.
Na nossa sociedade o mais provável é que nunca tenhamos a intenção de fazer algo assim, mas, ainda que de forma totalmente diferente, sempre iremos desenvolver e cultivar nossos próprios rituais. O principal objetivo dos rituais é preservar os valores e tradições de um grupo, e assim, afirmar sua identidade. Por esta razão, qualquer conjunto de indivíduos dotado de identidade irá realizar suas cerimônias. Os religiosos têm seus cultos, os militares têm suas marchas, os filósofos têm seus retiros, e com os cientistas não poderia ser diferente. Temos rituais de diversos tipos, dos mais cotidianos às grandes comemorações; dos menores, realizados em pequenos grupos, aos eventos com centenas de profissionais. Dentre os ritos que praticamos, podemos destacar alguns ritos de passagem, ritos de celebração, e ritos de exaltação. Nos últimos meses, a equipe do Laboratório de Limnologia teve a oportunidade de participar de uma grande variedade de rituais, e através deste texto, venho dividir alguns pensamentos sobre estes.
Um dos mais importantes ritos de passagem vivenciados por cientistas é a defesa de um trabalho desenvolvido ao longo de anos, como de uma dissertação de mestrado ou tese de doutorado. No dia 23 de Maio, Elder Sodré, membro do Laboratório de Limnologia UFRJ defendeu seu trabalho de Mestrado intitulado “Diversidade Funcional da comunidade zooplanctônica em um lago de planície de inundação”. Talvez alguns membros da família do Élder, não acostumados com o ambiente acadêmico, possa ter se espantado com a aparente incisividade no escrutínio realizado pelos professores membros da banca avaliadora. No entanto, não se trata de uma afronta, e sim de respeito pelo trabalho e pelos fundamentos da ciência, fazendo com que a qualidade do conhecimento produzido pelo aluno seja maximizada. Desta forma, os professores recebem o novo mestre em sua confraria.

Para um grupo que se dedica a busca eterna pelo conhecimento, é fundamental conhecer e valorizar o passado. E para valorizar aqueles que, neste passado, investiram tudo de si para construir o presente que conhecemos, temos nossos rituais de exaltação e homenagem. Um exemplo notável ocorreu no dia , no qual a Deputada Aspasia Camargo concedeu, em nome da ALERJ, o título de cidadão honorário do Estado do Rio de Janeiro para o professor Francisco de Assis Esteves, não só fundador do Laboratório de Limnologia UFRJ, como também diretor do NUPEM/UFRJ. Centenas de pessoas participaram na cerimônia, na qual foi lembrada a trajetória impressionante do professor Chico, do interior do Ceará para Alemanha, e então de volta para o Brasil, onde tanto contribuiu para a sociedade.

Exemplos como os anteriores não acontecem todos os dias. São frutos de muito empenho e dedicação, e apesar de culminarem nos momentos citados, foram construídos ao longo de muito tempo. No entanto, também temos nossos rituais cotidianos! Alguns muito simples, como o café para amenizar o peso das horas de trabalho. Outros acabam também por se tornar grandes eventos. Nós, da Limnologia UFRJ, temos um ritual principal, que ocorre duas vezes por ano – a Workshop do laboratório. Trata-se de uma reunião geral envolvendo todos os participantes do nosso grupo na qual se discutem os mais variados temas, desde aspectos do nosso cotidiano até questões filosóficas relacionadas aos propósitos da nossa equipe. Estas reuniões são fundamentais para que possamos manter a sincronia em um grupo tão grande e tão incrivelmente diverso. E não menos importante que a etapa anterior, fazemos uma grande confraternização após toda Workshop! Não há membro do laboratório que duvide da contribuição insubstituível desta comemoração para a coesão e intimidade do grupo.
Para um observador, estes e outros ritos podem parecer apenas formalidades e protocolos. Mas quem faz parte desta comunidade aprende a valorizar cada um destes momentos. São algumas peças que constituem nossa identidade, e graças a elas, nos situamos, e assim tornamo-nos parte de algo maior. Somos o grupo que dedica a vida a ciência.

….e assim como uma debutante fica radiante no dia de seus 15 anos, ao ser apresentada à sociedade, fiquei eu. Ao ser apresentada e integrada ao grupo. Sim, somos uma sociedade que gostamos de nossos ritos e onde os mesmos configuram sempre um momento marcante.
que estas experiências possam ser levadas para sempre por toda a sua vida!
O blog tá ficando igual a Scientific America! Bem legal!
Belo texto Daniel…bela costurada você deu. Ajudou-nos a refletir sobre quantas vezes, sem nem mesmo pensar e automaticamente alguns destes ritos, por achá-los chatos. Mas é a falta do contexto e da história que podem deixá-los assim.